Comumente, verificamos a prescrição do uso do Clexane (princípio ativo da enoxaparina sódica) para tratamento de grávidas em situação de trombose.
Ocorre que, em razão de ser um medicamento cuja dose tem que ser diária, muitas planos de saúde, de maneira abusiva, negam a cobertura do Clexane.
No entanto, tal negativa adota pelo plano de saúde é abusiva.
Isto porque, primeiramente, a doença trombose está prevista no CID-10, sendo, portanto, uma doença listada na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, observando o art. 10 da Lei 9656/98 (Lei dos Planos de Saúde):
Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto:
Além disso, o medicamento Clexane encontra-se devidamente registrado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
Assim, existe obrigatoriedade de custeio pelo plano de saúde do tratamento com o medicamento Clexane, quando este medicamento for o indicado pelo relatório médico como o mais adequado ao tratamento da doença.
Considera-se que se o médico prescreveu o tratamento não cabe ao plano de saúde se recusar indevidamente a fornecer os medicamentos indicados pelo médico que assiste o paciente. Logo, tendo sido Clexane prescrito por seu médico, existindo estudos que comprovam a eficácia dos medicamentos e sua autorização pela ANVISA, não cabe ao plano de saúde escolher a forma que o paciente será tratado.
Além disso, com a Lei nº 14.454/22, passou-se a entender que o rol da ANS é exemplificativo, por isso a ausência de previsão do tratamento pela ANS não pode justificar a negativa do plano de saúde.
Vale lembrar que a prescrição do medicamento pode ser feita por qualquer médico que acompanha o paciente, ou seja, não há necessidade de prescrição por médico credenciado ao seu plano de saúde.
Entendimentos sumulados.
Existem entendimentos sumulares que justificam a disponibilização do Clexane:
Súmula nº 96 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: “Havendo expressa indicação médica de utilização de determinado medicamento, cabe ao plano de saúde fornecê-lo, não configurando, de plano, violação ao contrato a cláusula que excluiu a cobertura de determinado tratamento.”
Com base nesta súmula, caso um paciente tenha indicação médica para uso do medicamento Clexane e o plano de saúde tenha excluído sua cobertura em contrato, o plano de saúde deverá fornecer o medicamento de qualquer forma.
Súmula nº 102 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: “Havendo expressa indicação médica, não prevalece a negativa de cobertura do custeio ou fornecimento de medicamentos associados a tratamento quimioterápico.”
Embora esta súmula faça menção específica a tratamentos quimioterápicos, ela também pode ser aplicada a outras medicações essenciais para o tratamento de doenças, como é o caso do Clexane. Assim, caso haja indicação médica para uso do medicamento, o plano de saúde deverá fornecê-lo, independentemente de cláusulas contratuais que excluam sua cobertura.
Súmula nº 96 do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro: “É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado.”
Embora esta súmula não faça menção direta ao Clexane, ela pode ser aplicada a situações em que o paciente necessita de internação hospitalar para receber o medicamento. Neste caso, caso o plano de saúde tenha cláusulas contratuais que limitem o tempo de internação, estas poderão ser consideradas abusivas e, portanto, inválidas.
É importante esclarecer que a apresentação de documento que comprove a indicação do medicamento pelo médico é muito importante, pois, preenchidos os requisitos expostos acima, não há por que o plano de saúde se negar a custear algum dos medicamentos, sob pena de ter sua conduta julgada como ilícita e abusiva.
Assim, existe obrigatoriedade de custeio pelo plano de saúde do tratamento com o medicamento Clexane, quando este medicamento for o indicado pelo relatório médico como o mais adequado ao tratamento da doença.
O entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca do Clexane.
- No julgamento do Recurso Especial (REsp) nº 1.491.566, a Terceira Turma do STJ entendeu que é abusiva a cláusula contratual que exclui a cobertura de medicamentos necessários ao tratamento de doença preexistente. Nesse caso, a operadora do plano de saúde negou a cobertura do Clexane sob a alegação de que se tratava de doença preexistente. O STJ considerou que a cláusula que exclui a cobertura de medicamentos necessários ao tratamento de doença preexistente é abusiva e que o Clexane é indispensável para o tratamento da doença.
- No julgamento do REsp nº 1.707.810, a Quarta Turma do STJ entendeu que o plano de saúde não pode excluir a cobertura de medicamento prescrito por médico, sob a alegação de que não consta no rol de procedimentos da ANS. Nesse caso, a operadora do plano de saúde negou a cobertura do Clexane sob a alegação de que não constava no rol de procedimentos da ANS. O STJ considerou que o rol da ANS é apenas uma referência para a cobertura de procedimentos e que não pode ser utilizado para negar a cobertura de medicamentos prescritos por médico.
- No julgamento do REsp nº 1.730.547, a Terceira Turma do STJ entendeu que a cláusula contratual que limita o custeio do Clexane é abusiva. Nesse caso, a operadora do plano de saúde limitou o custeio do Clexane a 28 ampolas por ano. O STJ considerou que a limitação do custeio do medicamento é abusiva, pois fere o direito à saúde e à vida.
Liminar para conseguir o Clexane.
É possível conseguir na justiça uma liminar para obrigar o custeio imediato do Clexane pelo plano de saúde. Essa decisão é proferida no início do processo e pode garantir economias importantes para os segurados de planos de saúde. Veja-se:
Isto posto, deduzidos todos os fundamentos expostos e tudo mais que consta dos autos, CONCEDO A TUTELA DE URGÊNCIA, em caráter antecipatório, e determino que a acionada autorize o fornecimento da medicação ENOXAPARINA (CLEXANE), nos moldes indicados no relatório médico, até o completo restabelecimento da parte acionante (CPF 026.086.115-40), providência que deverá ser cumprida no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, a partir da intimação da presente decisão, sob pena de multa diária de R$ 200,00, até ulterior deliberação deste Juízo.
Saliente-se que, em caso de descumprimento da decisão, deverá a parte autora informar a este Juízo, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de não ser computada a multa referente aos dias excedentes.
0077720-64.2019.8.05.0001, decisão em 21/05/2019
Nessa esteira, e uma vez concorrentes os pressupostos da aparência do bom direito e do periculum in mora, DEFIRO EM PARTE o PLEITO DE ANTECIPAÇÃO E TUTELA LIMINAR para determinar que a Requerida autorize e forneça em favor do tratamento de saúde da autora, no prazo de três dias úteis a contar da ciência desta decisão, a utilização da medicação Enoxaparina 40mg, na forma prescrita no relatório médico acostado ao feito, da lavra da Dra. Tayana F. Donato Alves, CRM 23534, sem qualquer ônus para a paciente, até final solução da lide, sob pena de conversão da obrigação de fazer em perdas e danos no caso de descumprimento, e limitado o valor da medicação ao teto dos Juizados Especiais.
Processo nº 0002544-12.2019.8.05.0088, decisão em 23/09/2019
Sobre o medicamento Clexane:
A indicação para a utilização do medicamento Clexane é elencada no site Consulta Remédios, veja-se:
Este medicamento é destinado para:
- Tratamento da trombose venosa profunda (formação ou presença de um coágulo sanguíneo dentro de um vaso) com ou sem embolia pulmonar (presença de um coágulo em uma artéria do pulmão);
- Tratamento da angina instável (dor no peito) e infarto do miocárdio sem elevação do segmento ST, administrado concomitantemente ao ácido acetilsalicílico;
- Tratamento de infarto agudo do miocárdio ( morte (necrose) de parte do músculo cardíaco por falta de aporte adequado de nutrientes e oxigênio) com elevação do segmento ST, incluindo pacientes a serem tratados clinicamente ou com subsequente intervenção coronariana percutânea (cateterismo cardíaco);
- Profilaxia do tromboembolismo venoso (prevenção da obstrução de um vaso sanguíneo por um coágulo de sangue na corrente sanguínea), em particular aqueles associados à cirurgia ortopédica ou à cirurgia geral;
- Profilaxia do tromboembolismo venoso em pacientes acamados devido a doenças agudas incluindo insuficiência cardíaca ( condição em que o coração é incapaz de bombear sangue suficiente para satisfazer as necessidades do corpo), falência respiratória, infecções severas e doenças reumáticas (doenças inflamatórias e degenerativas que afetam as articulações);
- Prevenção da formação de trombo na circulação extracorpórea durante a hemodiálise (método artificial para filtrar o sangue).
Sendo assim, é vasta a aplicabilidade do medicamento como agente de manutenção da saúde, portanto, sua prescrição e fornecimento tanto pelo SUS, como pelos planos de saúde tem respaldo jurídico básico
Precedentes judicias.
Colecionam-se, dessa maneira, decisões de tribunais concedendo, em sede de decisão liminar, o custeio do medicamento Clexane por parte do plano de saúde, conforme se vê
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C. INDENIZATÓRIA. DECISÃO QUE DEFERIU A TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA PARA DETERMINAR O FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO CLEXANE (ENOXAPARINA SÓDICA) À AGRAVADA. PLANO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE USO DOMICILIAR (APLICAÇÃO SUBCUTÂNEA) PARA TRATAMENTO DE TROMBOFILIA COM REGISTRO NA ANVISA. GRAVIDEZ DE RISCO. MEDICAMENTO ABSOLUTAMENTE NECESSÁRIO AO TRATAMENTO DA PATOLOGIA, DIANTE DO RISCO DE ABORTAMENTO. ENTENDIMENTO PACÍFICO NO STJ NO SENTIDO DE QUE É “ABUSIVA A RECUSA DE CUSTEIO DO MEDICAMENTO PRESCRITO PELO MÉDICO RESPONSÁVEL PELO TRATAMENTO DO BENEFICIÁRIO, AINDA QUE MINISTRADO EM AMBIENTE DOMICILIAR” (AGINT NO ARESP 1.433.371/SP). PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC/15. VERBETE 338 DA SÚMULA DE JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. AUSÊNCIA DE ARGUMENTOS CAPAZES DE MODIFICAR DECISÃO AGRAVADA. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
(TJ-RJ – AI: 00507272620218190000, Relator: Des(a). PAULO SÉRGIO PRESTES DOS SANTOS, Data de Julgamento: 22/11/2021, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 24/11/2021)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MATERIAIS E MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. PLANO DE SAÚDE. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA, DETERMINANDO FORNECIMENTO DE ENOXAPARINA SÓDICA (CLEXANE) À GESTANTE PORTADORA DE TROMBOFILIA. COBERTURA DE FARMÁCO. CLEXANE 40 MG. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR – 10ª C. Cível – 0036481-43.2020.8.16.0000 – Palmas – Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU HUMBERTO GONCALVES BRITO – J. 28.06.2021)
(TJ-PR – AI: 00364814320208160000 Palmas 0036481-43.2020.8.16.0000 (Acórdão), Relator: Humberto Goncalves Brito, Data de Julgamento: 28/06/2021, 10ª Câmara Cível, Data de Publicação: 02/07/2021)
Dessa forma, se você não possui plano de saúde, é possível solicitar o tratamento com medicamento Clexane através do SUS, caso haja relatório médico fundamentado no sentido da necessidade do referido medicamento para tratamento da trombofilia em gestantes.
O que fazer diante da negativa:
Nos casos em que ocorre o indeferimento indevido por parte do plano de saúde de fornecimento medicamentoso, indicado pelo relatório médico como imprescindível ao tratamento, é possível ajuizar uma ação judicial com pedido de liminar (a conhecida liminar médica) para que o plano seja obrigado a cobrir a o tratamento, bem como pleiteando a condenação por danos morais pelo indeferimento abusivo.
Ademais, recomenda-se o assessoramento de um advogado especializado em saúde para melhor acompanhamento da sua situação.
Quem é o Dias Ribeiro Advocacia?
O Dias Ribeiro Advocacia é um escritório de advocacia especializado em ações contra planos de saúde. Nos aperfeiçoamos diariamente para prestar o melhor serviço jurídico na tutela do direito à saúde de milhares de beneficiários de plano de saúde.
Se ficou com alguma dúvida, você pode retirá-la mandando para o nosso e-mail ribeiro@diasribeiroadvocacia.com.br.