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Trifluridina + Tipiracila devem ser custeadas por plano de saúde

Cobertura e Acesso à Trifluridina + Tipiracila (Lonsurf): Uso, Custos e Direitos dos Pacientes

Inicialmente, importa mencionar que esse artigo analisará o dever de custeio da trifluridina + cloridrato de tipiracila (Lonsurf®) pelos planos de saúde. 

Plano de saúde deve cobrir a trifluridina + tipiracila?

Quando o médico prescreve a trifluridina + cloridrato de tipiracila com justificativa específica, os planos de saúde devem custear o medicamento. Isso porque:

  • O medicamento possui registro sanitário na Anvisa, como antineoplásico oral TAS-102, indicado para câncer colorretal metastático e câncer gástrico metastático (incluindo adenocarcinoma da junção gastroesofágica); 

  • A ANS incorporou o medicamento ao Rol, tornando obrigatória a cobertura para essas indicações, conforme os critérios definidos na Diretriz de Utilização (DUT nº 64 – Terapia Antineoplásica Oral).

Cumpre salientar que, mesmo após a Lei 14.454/2022, que consolidou a natureza taxativa mitigada do rol da ANS, entende-se que, em situações específicas, a taxatividade deve admitir mitigações em favor do direito à saúde e à vida, sobretudo quando o paciente preenche as condições clínicas da bula e da própria DUT ou quando não há alternativa terapêutica eficaz.

Além disso, a trifluridina + tipiracila é uma opção importante para pacientes já submetidos a múltiplas linhas de quimioterapia, que permanecem com doença ativa.

Portanto, havendo recomendação médica específica e enquadramento nos critérios técnicos (bula e DUT), o plano de saúde se obriga a fornecer o medicamento.

Para que serve a trifluridina + tipiracila?

A trifluridina + cloridrato de tipiracila (TAS-102, marca Lonsurf®) é um quimioterápico oral indicado para:

  • Tratamento de pacientes adultos com câncer colorretal metastático (CCR m) previamente tratados com, ou não considerados candidatos a ’45rktterapias disponíveis;

  • Tratamento de pacientes adultos com câncer gástrico metastático (CG m), incluindo adenocarcinoma da junção gastroesofágica, já submetidos a pelo menos dois regimes prévios de tratamento sistêmico

O medicamento combina dois princípios ativos: Trifluridina – análogo de timidina que se incorpora ao DNA das células tumorais, interferindo na sua replicação e Cloridrato de tipiracila – inibidor da timidina fosforilase, que aumenta a biodisponibilidade da trifluridina. 

Trata-se de medicação de uso domiciliar, administrada em comprimidos, com esquema cíclico definido pelo oncologista.

O fato da administração ser domiciliar não retira o caráter de tratamento oncológico de alta complexidade, sendo, inclusive, regulada na mesma DUT de terapia antineoplásica oral. 

Quanto custa a trifluridina + tipiracila?

O custo da trifluridina + tipiracila é bastante elevado, variando conforme a dosagem, o peso do paciente, o número de comprimidos por ciclo e o tempo total de tratamento.

Em termos gerais, o valor de uma caixa com 60 comprimidos pode superar R$ 17.000,00 por mês. E é comum que o tratamento mensal ultrapasse esse patamar, especialmente em esquemas em que o paciente utiliza maior quantidade de comprimidos por ciclo.

Como o tratamento costuma ser de médio a longo prazo, o custo total tende a se acumular, atingindo cifras incompatíveis com a renda da maior parte das famílias.

Logo, justifica-se a necessidade de recorrer ao plano de saúde para seu fornecimento. Quando há negativa injustificada, a via judicial torna-se, muitas vezes, o caminho mais efetivo para garantir o acesso ao medicamento.

O que fazer diante da negativa do medicamento?

Em caso de negativa do plano de saúde para fornecer a trifluridina + tipiracila, o primeiro passo é solicitar resposta formal por escrito, em papel timbrado, e-mail ou na própria área do beneficiário, constando o motivo da recusa (como “não está no rol da ANS”, “foro experimental”, “fora da DUT” etc.).

Com esse documento em mãos, somado a:

  • Relatório e laudo médico detalhado, indicando o diagnóstico (com CID), tratamentos já realizados, justificativa da escolha da trifluridina + tipiracila e urgência;

  • Exames recentes que demonstrem a necessidade da medicação;

o paciente pode recorrer à Justiça para garantir o acesso ao medicamento.

Em boa parte dos casos, é possível obter esse acesso por meio de liminar (tutela de urgência), determinando que o plano forneça o remédio em curto prazo.

Para isso, a advocacia especializada em Direito à Saúde atua de forma essencial, conduzindo o processo e agilizando o início do tratamento oncológico.

O SUS deve cobrir a trifluridina + tipiracila?

O fornecimento da trifluridina + tipiracila pelo SUS segue lógica distinta da saúde suplementar. Em geral, o medicamento não foi incorporado ao SUS para as indicações de câncer colorretal metastático ou câncer gástrico metastático, havendo pareceres técnicos da CONITEC e NatJus apontando ausência de incorporação. 

Na prática, isso significa que, administrativamente, o paciente tende a encontrar negativas para recebimento da trifluridina + tipiracila na rede pública.

Todavia, preenchidos os requisitos do Tema 106 do STJ (imprescindibilidade do medicamento, incapacidade financeira do paciente e registro na Anvisa), é possível buscar o fornecimento da medicação por meio de ação judicial contra o Estado, mesmo não constando nas listas regulares do SUS.

O plano de saúde pode me oferecer outro medicamento no lugar da trifluridina + tipiracila?

A substituição da trifluridina + tipiracila por outro medicamento não é uma decisão que caiba ao plano de saúde.

A escolha do tratamento é de responsabilidade exclusiva do médico assistente, que avalia o histórico de quimioterapias, a resposta do tumor e as condições clínicas do paciente.

Assim, uma vez que o médico prescreve a trifluridina + tipiracila, o plano de saúde não pode impor a troca por outro quimioterápico ou protocolo mais barato por conveniência econômica, nem pode condicionar a cobertura a substituições sem o consentimento expresso do médico.

Qualquer tentativa de substituição indevida deve ser questionada. Em caso de recusa em custear o medicamento indicado, o paciente pode ajuizar ação judicial para exigir o cumprimento da prescrição.

O plano de saúde pode alegar que a trifluridina + tipiracila não observa as diretrizes de utilização da ANS?

Os planos frequentemente alegam que o paciente não se enquadra na DUT, tentando justificar a negativa com base em detalhes da Diretriz de Utilização da ANS.

No entanto, é importante observar que:

  • ANS incorporou a trifluridina + tipiracila à DUT nº 64 – Terapia Antineoplásica Oral, estabelecendo critérios claros para câncer colorretal metastático e câncer gástrico metastático em pacientes previamente tratados com terapias padrão em linhas anteriores;

  • Havendo relatório médico demonstrando que o quadro clínico do paciente se encaixa (ou que, mesmo não havendo enquadramento rígido, não há alternativa terapêutica eficaz), a jurisprudência costuma afastar negativas meramente burocráticas, aplicando a tese da taxatividade mitigada e o art. 10, §13, da Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/98, com redação da Lei 14.454/2022). 

Neste sentido, decisões vêm reconhecendo o dever de custeio de terapias orais antineoplásicas mesmo quando as operadoras se apoiam em leitura restritiva de DUT, desde que haja laudo médico consistente e evidência científica.

Quando é possível obter o fornecimento do medicamento na Justiça?

O fornecimento da trifluridina + tipiracila por meio de decisão judicial é possível quando:

  • O plano de saúde se recusa a cobrir o tratamento;

  • Há alegação de falta de previsão contratual, rol da ANS ou divergência com a DUT;

  • Ou quando o SUS nega o medicamento, mesmo diante da gravidade do caso.

Com laudo médico detalhado, negativa formal do plano (ou resposta administrativa do SUS) e comprovação da urgência, o paciente pode requerer uma tutela de urgência para obtenção rápida do tratamento, enquanto o processo segue em tramitação.

É possível obter uma liminar para conseguir a trifluridina + tipiracila?

Em situações de urgência – especialmente em oncologia, em que atrasos podem significar progressão tumoral irreversível – é plenamente possível obter liminar determinando o fornecimento imediato da trifluridina + tipiracila.

A liminar é uma medida judicial provisória que:

  • Garante o acesso ao medicamento em prazo reduzido;

  • Busca evitar dano irreparável ou de difícil reparação à saúde do paciente;

  • Permanece válida enquanto se discute o mérito da ação.

Ou seja, a liminar impede que o paciente fique sem tratamento enquanto o processo principal ainda está em andamento.

Este tipo de ação é causa “ganha”?

Nenhuma ação judicial possui garantia absoluta de êxito. No entanto, processos envolvendo medicamentos oncológicos de alto custo, com registro na Anvisa e indicação em bula e na DUT – como é o caso da trifluridina + tipiracila – apresentam, em geral, boas chances de sucesso, desde que:

  • Exista prescrição médica clara e fundamentada;

  • Haja comprovação de que outras terapias já foram tentadas ou não são adequadas;

  • A negativa do plano seja baseada apenas em rol da ANS, custo ou formalidade.

Os tribunais tendem a reconhecer o direito fundamental à saúde, aplicando a legislação de proteção ao consumidor e a interpretação mitigada do rol da ANS.

Cada caso, porém, demanda análise individual, motivo pelo qual o acompanhamento jurídico especializado é essencial.

Como conseguir a trifluridina + tipiracila no SUS?

No âmbito do SUS, o acesso à trifluridina + tipiracila depende, basicamente, de ordem judicial, já que o medicamento não foi incorporado formalmente às listas de cobertura rotineira. 

Assim, aplica-se o entendimento do Tema 106 do STJ, que exige a comprovação de:

  1. Imprescindibilidade do medicamento, demonstrada por laudo médico;

  2. Inexistência de alternativa terapêutica adequada disponível no SUS;

  3. Incapacidade financeira do paciente de arcar com o custo do tratamento;

  4. Registro na Anvisa, requisito já preenchido pela trifluridina + tipiracila.

Atendidos esses requisitos, o paciente pode propor ação contra o ente público (União, Estado e/ou Município), pleiteando liminar para fornecimento do medicamento.

O tratamento com trifluridina + tipiracila é experimental? O plano de saúde pode negar com essa alegação?

A trifluridina + cloridrato de tipiracila não é tratamento experimental:

  • Possui bula aprovada pela Anvisa com indicações específicas para câncer colorretal metastático e câncer gástrico metastático em terceira linha;

  • Foi incorporada ao Rol da ANS com cobertura obrigatória para essas indicações, constando na DUT nº 64 de terapia antineoplásica oral. 

Dessa forma, os planos de saúde carecem de base legal para negar o fornecimento da trifluridina + tipiracila sob o argumento de tratamento experimental. Quando há prescrição médica e enquadramento clínico, o Judiciário tende a considerar abusiva a negativa.

 

Escritório de Advocacia com atuação nacional e especializada em saúde e previdência.

Dias Ribeiro Advocacia - CNPJ: 36.213.393/0001-69.
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