Meu cônjuge desapareceu. E agora? É possível me divorciar?

Vamos supor que há um casal em matrimônio. Certo dia, eles decidiram se afastar. Contudo, não foi feito o divórcio à época. Atualmente, não há conhecimento do paradeiro do outro cônjuge tampouco contato com seus parentes. É possível mesmo assim se divorciar?

A resposta é positiva. Isto porque, com a Emenda Constitucional 66/2010, o divórcio tornou a ser um direito potestativo do cônjuge, de sorte que basta unicamente a vontade do cônjuge para que o divórcio ocorra. Esta liberalidade do divórcio é prevista na Magna Carta:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.

Portanto, o divórcio pode ser realizado a qualquer tempo e independente da vontade do outro cônjuge, sem que se precise cumprir qualquer condição.

É plenamente possível, desta forma, que o cônjuge ajuíze uma ação de divórcio litigioso em face do outro. Serão efetuadas judicialmente tentativas de localização de Paulo, através de sistemas de informação do Poder Judiciário.

Caso ainda assim não se encontre o paradeiro do cônjuge desaparecido, frustrada todas as tentativas de localização, será efetuada a sua citação por edital, nomeando-se, assim, um curador especial (exercido pela Defensoria Pública) para tratar da defesa dos interesses do ausente, conforme se depreende do art. 72, II do Código de Processo Civil, conforme se vê:

Art. 72.  O juiz nomeará curador especial ao:

(…)

II – réu preso revel, bem como ao réu revel citado por edital ou com hora certa, enquanto não for constituído advogado.

Parágrafo único.  A curatela especial será exercida pela Defensoria Pública, nos termos da lei.

Na ação de divórcio deve-se levar em consideração o patrimônio adquirido na constância do casamento, bem como a questão de regulamentação de guardas. Ao cônjuge ausente, deve ser garantida a sua parte do patrimônio, a chamada meação, caso houver. Caso haja filhos menores ou incapazes, deverá haver necessária intervenção do Ministério Público.

Sobre bens, guarda e alimentos, trarei da temática em outro artigo.

Supondo que os cônjuges não tenham constituído bens na constância do casamento, nem tenham filhos incapazes, e dispensem alimentos entre si, a questão será meramente de direito, podendo o juiz de valer do julgamento antecipado da lide (art. 355, I do Código de Processo Civil), em razão de o divórcio se tratar de questão unicamente de direito:

Art. 355.  O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:

I – não houver necessidade de produção de outras provas;

A sentença de divórcio declarará a extinção da sociedade conjugal.

Quando houver discussão quanto ao sobrenome/patronímico adotado por ocasião do casamento, é liberalidade do cônjuge decidir se deve mantê-lo ou retirá-lo, ainda que o cônjuge tenha sido revel.

Segundo ensinamentos de Cristiano Chaves de Farias, a regra da manutenção do nome patronímico é aplicada, visto que o nome é um direito da personalidade, incorporando-se à personalidade jurídica do particular. Desta forma, na ação de divórcio, a regra é que o cônjuge permanecerá com o nome de casado, salvo se expressa manifestação deste em sentido contrário. [1]

Nesse sentido, em relação ao caso de revelia (quando o cônjuge está ausente/desaparecido e não se manifestou acerca de determinado ponto), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já posicionou no sentindo de que o fato da revelia não induz procedência do pedido da outra parte na exclusão do sobrenome adotado.

Entendeu o STJ de que o nome se trata de direito indisponível enquanto direito da personalidade, não podendo ser aplicado os efeitos da revelia (presumir verdadeiros os fatos alegados pelo autor). [2]

Desta forma, fixou a tese que “A revelia em ação de divórcio na qual se pretende, também, a exclusão do patronímico adotado por ocasião do casamento não significa concordância tácita com a modificação do nome civil.” [3]

 

Conclusão:

É plenamente possível realizar o divórcio quando um cônjuge esteja desaparecido, em razão do direito potestativo do divórcio. Este divórcio deve ser realizado na via judicial, na modalidade litigioso, ante a ausência do outro cônjuge.

Não havendo bens ou filhos incapazes, é possível que o juiz julgue antecipadamente a lide, uma vez que o direito ao divórcio em questão trata de matéria exclusivamente de direito.

Quanto ao nome, este somente poderá ser suprimido quando houver manifestação expressa de vontade do cônjuge nesse sentido, ainda que seja revel na ação.

Ressalte-se que para qualquer modalidade de divórcio, é necessária a presença de advogado.

Restou alguma dúvida? Você pode retirá-la mandando para ribeiro@diasribeiroadvocacia.com.br ou encontrar mais informações de contato clicando aqui.

 

[1] FARIAS, Cristiano Chaves de; NETO, Felipe Braga; ROSENVALD, Nelson. Manual de direito civil, volume único, Salvador: Editora Juspodivm, 2017, p. 1759.

[2] REsp 1.732.807-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 14/08/2018, DJe 17/08/2018.

[3] Ibidem.