Quais insumos o plano de saúde deve custear em um ato cirúrgico?
Para a realização de uma cirurgia, são necessários inúmeros insumos – para além da mão-de-obra médica e diária do centro cirúrgico, podem ser necessários medicamentos, próteses, e muitos outros. Afinal, o plano de saúde é obrigado a custeá-los?
Neste sentido, não é raro que planos de saúde neguem a cobertura integral de determinados procedimentos cirúrgicos, dispondo-se a cobrir somente parte dos gastos inerentes ao procedimento.
A posição dos planos, no entanto, não encontra respaldo na legislação, nem na jurisprudência.
O entendimento pacificado nos tribunais sobre a obrigatoriedade do plano de saúde no custeio de insumos.
O entendimento até então pacificado é de que, conforme os princípios do Direito do Consumidor e o disposto no art. 10 da Lei dos Planos de Saúde, as operadoras de plano de saúde podem limitar as doenças cobertas pelo seguro, mas não os tratamentos disponíveis ao médico.
Com efeito, ocorrendo doença não expressamente excluída, a operadora deve assegurar todo e qualquer tratamento necessário ao diagnóstico e pronto restabelecimento do paciente-beneficiário.
Dessa forma, a tentativa dos planos de eximir-se de sua obrigação de cobertura alegando a inexistência de determinado insumo no rol de procedimentos mínimos obrigatórios da ANS também já foi rechaçada pelos tribunais, que entendem que aquela lista de procedimentos é exemplificativa e não limita a atuação dos planos de saúde.
Neste sentido, uma vez que seja necessária uma cirurgia em razão de uma doença coberta, o plano não pode limitar o pagamento dos insumos, ou determinar um teto ou tempo máximo de internação para os sujeitos.
Com efeito, todo o material necessário à realização da cirurgia deve ser assegurado pelo plano de saúde e o único profissional habilitado para determinar o que é ou não necessário à realização da cirurgia é o médico assistente.
O entendimento do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Foi este o posicionamento do Ministro João Otávio de Noronha na relatoria do AgRg no Ag em REsp nº 677.096 julgado ainda em 2015:
Ressalte-se que o acórdão recorrido está em consonância com o entendimento do STJ de que são abusivas as cláusulas que limitam a cobertura securitária pelas operadoras de plano de saúde por autogestão, regidas pela Lei n. 9.656/98, quando se justificam na negativa infundada de fornecimento de material indispensável ao procedimento cirúrgico que, além de ter sido indicado pelo médico, está previsto no rol de procedimentos da ANS.
Posição similar foi adotada pelo Ministro Luís Felipe Salomão a respeito de próteses:
AGRAVO REGIMENTAL. PLANO DE SAÚDE ANTERIOR À LEI 9.656/98. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO COBERTO PELO PLANO. PRÓTESE. CUSTEIO DEVIDO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO ARTIGO 535 DO CPC. RECURSO ESPECIAL. PRETENSÃO DE REVISÃO DE MATÉRIA FÁTICA E CLÁUSULA CONTRATUAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 5 E 7 DO STJ FUNDAMENTAÇÃO RECURSAL DEFICIENTE E AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO A ARGUMENTO CONSTITUCIONAL DO ACÓRDÃO. APLICAÇÃO DAS SÚMULA 284 E 283 DO STF. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO COM APLICAÇÃO DE MULTA.
[…] 4. Nos termos da jurisprudência consolidada no STJ ‘É considerada abusiva, mesmo para contratos celebrados anteriormente à Lei 9.656/98, a recusa em conferir cobertura securitária, para indenizar o valor de próteses necessárias ao restabelecimento da saúde’ (REsp 918.392/RN, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, DJe 01/04/2008).5. Agravo regimental não provido, com aplicação de multa.” (AgRg no AREsp n. 143.474/PB, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 9/10/2012.)
O posicionamento do STJ vem sendo acompanhado por tribunais de todo o país, que reconhecem a obrigação dos planos de saúde assegurarem todo e qualquer insumo necessário à realização da cirurgia, independente de previsão expressa no rol de procedimentos da ANS, desde que haja recomendação médica e registro na ANVISA.
O posicionamento do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.
Ademais, por inúmeras vezes já decidiu o Tribunal de Justiça da Bahia pela obrigatoriedade desta cobertura pelo plano de saúde, identificando mesmo dano moral indenizável em decorrência da negativa abusiva e ilícita das operadoras.
Estabeleceu o tribunal que “os planos de saúde podem, por expressa disposição contratual, restringir as enfermidades a serem cobertas, mas não podem limitar os tratamentos a serem realizados”.
Com efeito, o tribunal decidiu, inclusive, que a despeito de não serem aplicáveis as regras do CDC na relação estabelecida, uma vez que se configura entidade de autogestão, isso não impede que se submeta às regras da ANS, nem que seja reconhecida a abusividade das restrições impostas de cobertura.
(TJ- BA, Classe: Apelação, Número do Processo: 0010122-60.2013.8.05.0080, Relator(a): JOSE EDIVALDO ROCHA ROTONDANO,Publicado em: 16/06/2020 )
O posicionamento do Tribunal do Rio de Janeiro sobre o custeio de materiais pelo plano de saúde.
Outros tribunais, como o do Rio de Janeiro, também seguem a mesma linha, como se observa das seguintes súmulas deste tribunal:
Nº. 112 “É nula, por abusiva, a cláusula que exclui de cobertura a órtese que integre, necessariamente, cirurgia ou procedimento coberto por plano ou seguro de saúde, tais como “stent” e marcapasso.”
Referência: Súmula da Jurisprudência Predominante nº. 2006.146.00003. Julgamento em 11/09/2006. Relator: Desembargadora Maria Henriqueta Lobo. Votação por unanimidade
Nº. 340 “Ainda que admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor, revela-se abusiva a que exclui o custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento da doença coberta pelo plano.”
Referência: Processo Administrativo nº. 0053831-70.2014.8.19.0000 – Julgamento em 04/05/2015 – Relator: Desembargador Jesse Torres. Votação por maioria.
Conclusão – Material deve ser custeado por plano de saúde?
Verifica-se, portanto, que há um consenso nos tribunais, guiados pela jurisprudência superior do STJ, no sentido de que os planos de saúde são obrigados ao custeio de todo e qualquer material que se afigure necessário, no juízo médico, ao sucesso das intervenções cirúrgicas.
Assim, será abusiva qualquer forma de limitação imposta pela operadora do plano de saúde e por isso passível de reversão junto ao poder judiciário.
Neste sentido, já foi escrito um artigo neste sítio sobre a obrigatoriedade de custeio dos insumos e medicamentos durante a internação domiciliar.
Nestes termos, a negativa de cobertura de intervenção cirúrgica por parte de plano de saúde, independente de sua modalidade, seja a negativa total ou parcial, será reputada abusiva e a cláusula que a fundamenta será tida por não escrita.
Diante da negativa abusiva, é possível, com a assistência de advogado especializado, buscar o poder judiciário para reverter a situação, sendo possível pleitear tutela de urgência que determine a autorização e cobertura imediata do procedimento integral, bem como indenização por danos morais.
Quem somos?
O Dias Ribeiro Advocacia é um escritório de advocacia especializado na viabilização de tratamentos médicos negados pelos planos de saúde. Entre em contato por meio de nosso e-mail ribeiro@diasribeiroadvocacia.com.br.