Apólice de plano de saúde para funcionários ativos e outra para inativos: ilegalidade absoluta.

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Recentemente lidamos com o caso de uma aposentada que, após o ato de aposentadoria, foi surpreendida com a migração do seu plano de saúde de uma apólice empresarial dedicada a funcionários ativos para outra apólice de inativos. Com a mudança, a aposentada sofreu uma substancial majoração nas mensalidades de seu convênio, em virtude dos diferentes fatores atuariais que norteavam as duas apólices.

É de se deixar claro que a discriminação de preços entre ativos e inativos é absolutamente ilegal, e não encontra amparo na Lei 9.656/98, que regra os planos de assistência médica.

O regramento da manutenção do plano de saúde para aposentados e demitidos sem justa causa.

É importante salientar que o aposentado ou o ex-empregado exonerado ou demitido sem justa causa, que contribuía para o custeio do seu plano privado de saúde, tem o direito de manter as mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, sem prejuízo de eventuais vantagens obtidas em negociações coletivas. Existe um artigo em nosso site sobre este tema.

A empresa empregadora é obrigada a manter o aposentado ou o ex-empregado demitido ou exonerado sem justa causa no plano enquanto o benefício for ofertado para os empregados ativos, desde que o aposentado ou o ex-empregado demitido ou exonerado sem justa causa, tenha contribuído para o custeio do seu plano privado de saúde e que o mesmo não seja admitido em novo emprego.

A decisão do aposentado ou o ex-empregado demitido sem justa causa de se manter no plano deve ser informada à empresa empregadora no prazo máximo de 30 dias contados a partir da comunicação do empregador sobre o direito de manutenção do gozo do benefício.

O período de manutenção no plano de saúde dependerá do regramento legal aplicável, sendo distintas as regras para aposentados e para funcionários demitidos sem justa causa. Veja-se:

  • Aposentado que contribuiu para o plano de saúde por 10 anos ou mais –  tem o direito de se manter no plano enquanto a empresa empregadora oferecer esse benefício aos seus empregados ativos e desde que não seja admitido em novo emprego.
  • Aposentado que contribuiu para o plano de saúde por período inferior a 10 anos – poderá permanecer no plano por um ano para cada ano de contribuição, desde que a empresa empregadora continue a oferecer esse benefício aos seus empregados ativos e que não seja admitido em novo emprego.
  • Ex-empregado demitido ou exonerado sem justa causa – a manutenção no plano será correspondente a 1/3 (um terço) do tempo de permanência em que tenha contribuído para o plano, com um mínimo assegurado de seis e um máximo de 24 meses.

Como contratar um plano de saúde sem dor de cabeça - ViDA & Ação

A ilegalidade da criação de duas apólices e da discriminação de preços entre ativos e inativos.

A ilegalidade da existência de dois valores de planos de saúde para ativos e inativos decorre da interpretação dos artigos 30 e 31 da Lei 9.656/98, ao dispor a legislação que os planos de saúde serão mantidos para estes trabalhadores nas mesmas condições de cobertura assistencial.

Veja-se:

Art. 30.  Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.[…]

Art. 31.  Ao aposentado que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, pelo prazo mínimo de dez anos, é assegurado o direito de manutenção como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.        

Dessarte, é absolutamente ilegal a postura da empresa que cria duas apólices: uma dedicada aos trabalhadores ativos e outra dedicada aos trabalhadores aposentados, caso estas duas apólices impliquem em valores distintos de plano de saúde para seus beneficiários, ou diferentes condições de cobertura assistencial.

A matéria já foi julgada por diversos magistrados ao longo do Brasil, sendo importante a referência ao seguinte julgado:

Apelação. Plano de saúde. Pretensão de empregado, já aposentado, demitido sem justa causa em continuar a desfrutar plano coletivo de assistência médica disponibilizado por ex-empregadora, nos exatos moldes quando da vigência do contrato de trabalho. Pretensão fundamentada no artigo 31 da Lei Federal 9.656/98. Controvérsia a respeito do preço da mensalidade a viger após modificação realizada pela operadora, que substituiu apólices até então vigentes, em decisão extensiva para toda a universalidade de beneficiários, ativos e inativos. Autor se nega a aceitar as modificações, uma vez que o preço oferecido é reputado oneroso e desconectado das diretrizes da Lei nº 9.656/98. Sentença de procedência. Inconformismo da ré Unimed de Salto/Itu. Não provimento. Sentença mantida por seus próprios fundamentos (artigo 252, RITJSP). 1. Após o desligamento do autor da empresa, o cômputo da mensalidade deverá abranger a integralidade do prêmio, não só aquele montante descontado mensalmente do salário do autor, como também a cota parte assumida pela ex-empregadora. Respeito à regra de que o empregado tem direito a ser conservado no plano de saúde oferecido por sua ex-empregadora, desde que efetue o pagamento integral da respectiva contraprestação, sem qualquer distinção com o plano oferecido aos empregados ativos. Verificada onerosidade excessiva na modificação contratual que gerou aglutinação das carteiras dos ativos e inativos, haja vista aumento absoluto das contraprestações cobradas e também exigência de coparticipação, que não subsistia no plano originário anterior. Pagamento integral da mensalidade qualificado pela quantia exigida do usuário, e sua esposa dependente, no momento de sua aposentadoria, antes da modificação contratual empreendida pela ré. 2. Recurso desprovido.

(TJ-SP 10033084520168260526 SP 1003308-45.2016.8.26.0526, Relator: Piva Rodrigues, Data de Julgamento: 01/08/2017, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/08/2017)

Ademais, é sempre importante observa que o direito da prestação à saúde se encontra protegido, sobretudo, pela Carta Magna, uma vez que a Constituição de 1988 reservou um lugar de destaque para a saúde, erigida à categoria de direito social, fundamental, inalienável e indisponível, advindo, de tal posicionamento, inúmeras consequências práticas, sobretudo no que tange à sua efetividade, dispondo:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Ademais, o contrato com o plano de saúde subordina-se às normas objetivo fixadoras de direitos fundamentais do cidadão, a saber, o direito à vida e à saúde.

Outrossim, cumpre salientar que a saúde constitui bem vinculado à dignidade da pessoa humana, conforme bem elucidou o Ministro Marco Aurélio no âmbito do Recurso Extraordinário 566.471/RN, objeto de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal. Vejamos:

[…]A saúde, nela englobado o acesso a medicamentos, constitui bem vinculado à dignidade do homem. É verdade que o desenvolvimento da dimensão objetiva do direito à saúde deve ficar a cargo de políticas públicas. Todavia, os traços de fundamentalidade, inalienabilidade, essencialidade e plena judicialização desses direitos estarão sempre presentes na dimensão do mínimo existencial. O direito à saúde como direito ao mínimo existencial é direito fundamental.[…]

Logo, é absolutamente ilegal e violadora de direitos fundamentais a discriminação entre ativos e inativos, sendo cabível o ajuizamento de uma ação judicial para adequação dos valores do plano de saúde dos inativos aos funcionários ativos.

 

 

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