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Somatotrofina deve ser fornecido pelo plano de saúde

Cobertura e Acesso à Somatotrofina: Uso, Custos e Direitos dos Pacientes

A discussão sobre o custeio da somatotrofina pelos planos de saúde é tema recorrente no Judiciário brasileiro, dada a sua importância terapêutica e o elevado custo envolvido. A somatotrofina, também conhecida como somatotropina, é o hormônio do crescimento humano (GH) sintético, utilizado principalmente para tratar a deficiência desse hormônio em crianças e adultos. Os médicos consideram esse medicamento essencial, e os planos de saúde devem garantir seu acesso de forma ampla e irrestrita sempre que houver indicação fundamentada.

Os planos de saúde devem fornecer a somatotrofina?

Sim, desde que haja prescrição médica com indicação expressa e justificativa detalhada, os planos de saúde devem custear a somatotrofina. Isso decorre diretamente do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, ao interpretar a Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/98), estabelece que medicamentos necessários à manutenção da vida e da saúde, mesmo que fora do rol da ANS, devem ser fornecidos. No caso da somatotrofina, a situação é ainda mais evidente, pois o medicamento está incluído no rol da ANS para diversas indicações terapêuticas.

Ademais, os tribunais vêm aplicando a Lei nº 14.454/2022, que reforça o entendimento de que o rol da ANS possui natureza taxativa mitigada. Isso significa que, embora o rol seja uma referência obrigatória, ele pode ser relativizado diante de situações clínicas concretas, desde que haja respaldo médico e evidências científicas.

Para que serve a somatotrofina?

A somatotrofina é indicada para tratar a deficiência do hormônio do crescimento (GH), tanto em crianças com baixa estatura idiopática ou decorrente de doenças genéticas, como a síndrome de Turner, quanto em adultos com deficiência adquirida ou congênita. Sua ação estimula o crescimento ósseo e muscular, melhora a composição corporal, regula o metabolismo de gorduras, proteínas e carboidratos, e fortalece a densidade óssea.

Trata-se de um tratamento de longa duração, frequentemente necessário por vários anos, especialmente quando iniciado na infância. Em alguns casos, o uso se estende até a idade adulta, sempre com controle e acompanhamento rigoroso do endocrinologista. A administração é domiciliar, por meio de aplicações subcutâneas diárias ou alternadas, realizadas com o uso de canetas aplicadoras.

Por que há tantas negativas dos planos de saúde?

As negativas mais comuns dos planos de saúde para o fornecimento da somatotrofina baseiam-se em três principais argumentos: o uso domiciliar do medicamento, o alto custo e a alegada inexistência de previsão contratual. No entanto, todos esses fundamentos têm sido afastados pela jurisprudência.

Primeiramente, a alegada impossibilidade de fornecimento de medicamentos de uso domiciliar é inconstitucional. O STJ possui entendimento pacífico de que a via de administração não exclui o dever de cobertura, quando o medicamento é essencial à saúde do paciente.

Em segundo lugar, o elevado preço da somatotrofina não pode justificar a negativa. O valor médio mensal do tratamento pode ultrapassar R$ 2.000,00 ou R$ 3.000,00, dependendo da marca e da dose necessária, mas isso não exime a operadora de arcar com o custeio. O direito à vida e à saúde prevalece sobre questões econômicas, conforme diversos julgados dos tribunais brasileiros.

Por fim, a previsão contratual genérica não pode restringir tratamentos específicos que possuem respaldo médico e previsão no rol da ANS. A recusa com base nessa justificativa é considerada abusiva.

Veja-se: 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – TUTELA DE URGÊNCIA – ART. 300 DO CPC – PLANO DE SAÚDE – FORNECIMENTO DE HORMÔNIO DO CRESCIMENTO -SOMATROPINA – DESENVOLVIMENTO FÍSICO E PSÍQUICO – NECESSIDADE COMPROVADA. – A finalidade básica do contrato de plano de saúde é garantir atendimento e manutenção da saúde dos seus consumidores, assim não vislumbra justificável a recusa para cobertura do tratamento domiciliar – É de se mencionar que a vida é o maior bem jurídico protegido pelo ordenamento jurídico, sendo, com efeito, superior aos direitos meramente patrimoniais. Assim, à reforma da decisão agravada .

(TJ-MG – Agravo de Instrumento: 22124542020248130000, Relator.: Des.(a) Alberto Diniz Junior, Data de Julgamento: 04/10/2024, Câmaras Cíveis / 3ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/10/2024)

E ainda:

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete do Des. Raimundo Nonato de Souza Braid Filho (1ª CC)- F:() AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) nº 0018362-02.2022.8 .17.9000 AGRAVANTE: ANTONIO GONCALVES DA MOTA SILVEIRA NETO AGRAVADO: BRADESCO SAÚDE S/A EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO . MÉRITO. PLANO DE SAÚDE. PACIENTE PORTADOR DE BAIXA ESTATURA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO . SOMATROPINA. USO DOMICILIAR. INCORPORAÇÃO DO HORMÔNIO DE CRESCIMENTO AO ROL DE PROCEDIMENTOS DA ANS. RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 465/2021 DA ANS . COBERTURA OBRIGATÓRIA. ABUSIVIDADE DA NEGATIVA. COMPETÊNCIA DO MÉDICO ASSISTENTE PARA INDICAR O TRATAMENTO NECESSÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO . DECISÃO UNÂNIME. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Agravo de Instrumento, sendo partes as acima indicadas, acordam os Excelentíssimos Desembargadores que compõem a 1ª Câmara de Direito Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco, por unanimidade de votos, em dar provimento ao Agravo de Instrumento, nos termos do voto do Relator, estando tudo de acordo com as notas Taquigráficas, votos e demais peças que passam a integrar este julgado. Recife, data da assinatura eletrônica. Des . Raimundo Nonato de Souza Braid Filho Relator

(TJ-PE – Agravo de Instrumento: 00183620220228179000, Relator.: AGENOR FERREIRA DE LIMA FILHO, Data de Julgamento: 15/07/2024, Gabinete do Des. Raimundo Nonato de Souza Braid Filho (1ª CC))

Quanto custa o tratamento com somatotrofina?

O custo do tratamento com somatotrofina varia de acordo com a marca, a dosagem e a durabilidade de cada aplicação. Por exemplo, a caneta Genotropin 12 mg (36 UI) pode custar cerca de R$ 2.277,24, enquanto o Norditropin FlexPro 15 mg/45 UI ultrapassa os R$ 2.190,00. Além disso, medicamentos como Hormotrop e Omnitrope apresentam variações de preço que vão de R$ 1.400,00 a R$ 3.000,00 por mês, a depender da apresentação.

Assim, é evidente que o valor acumulado ao longo dos meses torna o tratamento inacessível para grande parte da população sem o suporte do plano de saúde. Por isso, é comum que os pacientes necessitem recorrer à Justiça para garantir esse direito.

O que fazer diante da negativa do plano de saúde?

Caso o plano de saúde negue o fornecimento da somatotrofina, o paciente deve, primeiramente, solicitar a negativa formal por escrito. Esse documento é essencial para comprovar a recusa.

Em seguida, deve-se reunir o laudo médico detalhado, preferencialmente emitido por especialista em endocrinologia, que justifique a necessidade do medicamento. Também é recomendável anexar cópias de exames que evidenciem a deficiência do GH.

Com essa documentação, é possível ingressar com uma ação judicial para requerer o fornecimento da somatotrofina. Em casos de urgência, pode-se solicitar uma liminar, que, se deferida, garante o fornecimento imediato do medicamento antes mesmo da sentença final.

Como os tribunais têm decidido sobre o tema?

Os tribunais têm decidido amplamente a favor dos pacientes. Tribunais de todo o país reconhecem o direito de acesso à somatotrofina, com base no direito fundamental à saúde, na recomendação médica e no princípio da dignidade da pessoa humana.

Além disso, o entendimento dominante é o de que o plano de saúde não pode substituir o tratamento prescrito pelo médico, nem impor opções terapêuticas alternativas sem aval do profissional que acompanha o paciente. Portanto, uma vez indicada a somatotrofina como a melhor alternativa, cabe à operadora cumprir com a cobertura.

E se o plano alegar que não está no rol da ANS?

Como mencionado, a somatotrofina consta no rol da ANS para diversas indicações, e mesmo que não estivesse, isso não justificaria a negativa se houver respaldo médico e evidências científicas. A Lei nº 14.454/2022 reforçou esse entendimento ao autorizar os planos de saúde a cobrirem medicamentos fora do rol em situações excepcionais devidamente comprovadas.

Quanto tempo demora uma ação judicial desse tipo?

Embora o tempo de tramitação varie, os juízes geralmente analisam as liminares com rapidez, especialmente quando a saúde do paciente corre risco. Em muitas ações, eles determinam o fornecimento do medicamento em até 48 horas após concederem a liminar. O processo principal, contudo, pode levar meses até a sentença definitiva.

Considerações finais

Diante de tudo isso, conclui-se que o plano de saúde tem, sim, o dever de custear a somatotrofina sempre que houver prescrição médica e necessidade comprovada. Os tribunais consideram abusiva a recusa fundamentada em uso domiciliar, custo elevado ou ausência no rol da ANS.

Portanto, pacientes que enfrentam negativas devem buscar orientação jurídica especializada para assegurar o acesso ao tratamento. A Constituição garante o direito à saúde, e os planos de saúde devem assegurar a cobertura da somatotrofina, um medicamento essencial.

Escritório de Advocacia com atuação nacional e especializada em saúde e previdência.

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