Litisconsórcio – Delimitação

Análise do instituto do litisconsórcio no âmbito do processo civil.

Este estudo se volta a analisar, de modo breve, o instituto do litisconsórcio à luz do Novo Código de Processo Civil.

1 – Conceito

O processo caracteriza-se pela presença de, ao menos, dois sujeitos parciais: autor e réu. Não raro, entrementes, a lide envolve mais de duas pessoas figurando na posição de autores ou de réus. A este fenômeno de pluralidade de partes no processo dá-se o nome de litisconsórcio.[1] 

Com efeito, o litisconsórcio caracteriza-se pela coexistência de duas ou mais pessoas do lado ativo ou do lado passivo da relação processual, ou mesmo em ambas as posições, consoante conceito de Chiovenda verberado por Cândido Dinamarco.[2] 

 

2. Casos legais de cabimento do litisconsórcio:

O Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) explicita casos legais de cabimento do litisconsórcio. Como bem salienta a doutrina, entre eles há uma escalada de intensidade do vínculo que une os litisconsortes, desde um vínculo fortíssimo, manifestado na comunhão, até um muito tênue, referente à mera afinidade de questões. [3]

Passamos a examinar as hipóteses veiculadas no artigo 113 do Código de Processo Civil. O referido preceptivo dispõe que duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando houver entre elas:

I – Comunhão de direitos ou obrigações.

É o que se dá, por exemplo, no caso de condôminos sobre o bem quando se faculta a cada condômino, singularmente, reivindicar o todo, podendo todos eles, contudo, em litisconsórcio facultativo, demandar em conjunto o bem comum, consoante preconiza o art. 1.314 do Código Civil. [4] 

Outro exemplo digno de referência é o caso da demanda que veicula discussão de direito real de imóvel titularizado pelos cônjuges (art. 1.657 do Código Civil).

Neste caso, contudo, o litisconsórcio apenas se forma no polo passivo da demanda, uma vez que para o presente trabalho inexiste a figura do litisconsórcio ativo necessário. Neste contexto, a outorga uxória ou material revela-se como elemento integrativo da legitimidade das partes, e não impõe o ingresso dos cônjuges na demanda.

II – Conexão pelo pedido ou pela causa de pedir.

O melhor exemplo para explicitar esta hipótese de litisconsórcio é o de um só ato ilícito que atinge uma pluralidade de vítimas. Neste caso, cada uma das vítimas poderá propor demandas individuais, ou todas podem unir-se para, sob a forma de litisconsórcio, demandar o responsável.[5]

III – Afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito;

Não se vislumbra conexão nesta hipótese. Visa-se a economia processual. Um exemplo que pode ser referido é o de ameaça de lançamento de um mesmo tributo ilegal a diversos contribuintes. Verifica-se que para cada um deles haveria um fato jurídico distinto, que poderia ser verificado em demandas inidividuais. A lei autoriza, nestes casos, por economia processual, a formação de litisconsórcio.

3. Litisconsórcio unitário e simples.

Há litisconsórcio unitário quando o provimento jurisdicional de mérito tem de regular de modo uniforme a situação jurídica dos litisconsortes[6].

Existem dois requisitos veiculados na obra de Fredie Didier para caracterização do litisconsórcio unitário: a) os litisconsortes discutem uma única relação jurídica; b) esta relação jurídica é indivisível.[7]

É exemplo de litisconsórcio unitário de dois condôminos em demanda para proteger a coisa comum.

Há de se alertar para o fato de que não é tanto a questão da decisão que define o litisconsórcio unitário. Deve-se buscar o motivo para que esta decisão uniforme se imponha: a relação jurídica única. Com efeito, não é unitário o litisconsórcio no caso de dois servidores que demandem certo reajuste em seus vencimentos, ainda que o juiz julgue favoravelmente a ambos. Não é porque nada obriga o magistrado a adotar soluções idênticas neste caso concreto, por não haver relação jurídica única. [8]

 

4- Litisconsórcio Necessário e facultativo. Classificação quanto a obrigatoriedade de sua formação.

O litisconsórcio será conceituado como necessário quando a lei obriga a sua formação , ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes, consoante delimitação legal do art. 114 do CPC.

Em outras palavras, o litisconsórcio será necessário por imposição legal ou quando, sendo unitário, se verificar a necessidade da presença no processo de todos os litisconsortes. 

Dessa forma, verifica-se que, para o presente trabalho, a unitariedade não implica necessariedade, sendo possível a existência de litisconsórcio unitário facultativo, mesmo no polo passivo da demanda.

Com efeito, o litisconsórcio unitário pode ser erigido sem a obrigatoriedade da presença de todos os cointeressados, bastando, para tal, que a lei material confira legitimidade para qualquer cotitular defender individualmente o interesse comum, como se dá, aliás, no caso de obrigações solidárias que podem ser exigidas de um, alguns ou todos os coobrigados, a critério do credor. [9]

São exemplos de litisconsórcio necessário o caso da ação movida em face de cônjuges relacionada a direito real a eles afeto.

O litisconsórcio facultativo, de sua vez, constitui conceituação alcançada por exclusão, que abarca grande pluralidade de casos. Se dá, justamente, quando inexiste obrigatoriedade em sua formação.

 

5- Litisconsórcio ativo necessário.

Para o presente estudo, inexiste a figura do litisconsórcio ativo necessário. Trata-se de figura que viola a garantia constitucional de acesso ao Poder Judiciário, representada pela inafastabilidade do controle jurisdicional. Neste sentido, um dos consortes poderia ser simplesmente impedido de ajuizar a demanda, por discordância de seu consorte. [10]

Há de se salientar, contudo, que a matéria é complexa e há posicionamentos em sentido adverso, o que não será explorado na presente investigação.

 

6 – Natureza da sentença proferida em face de litisconsorte necessário não citado.

Na hipótese de ausência de citação do litisconsorte necessário , sendo o caso de litisconsórcio necessário unitário passivo, a falta de citação de qualquer dos réus torna a sentença, além de ineficaz em relação a qualquer deles, também passível de invalidação a qualquer tempo (art. 115, II, do CPC).

Se o litisconsórcio necessário for simples, a sentença é válida e eficaz em relação aqueles que participaram da demanda, não o sendo, porém, em face dos quais não integraram o contraditório (art. 115, II, do CPC). Neste ponto, há de se reiterar a existência de nulidade também neste caso, a decisão é defeituosa, e como tal pode ser invalidada.[11]

 

7 – Tratamento dos Litisconsortes.

A matéria do tratamento dos litisconsortes está tratada no art. 117 do Código de Processo Civil, segundo o qual os litisconsortes serão considerados, em suas relações com a parte adversa, como litigantes distintos, exceto no litisconsórcio unitário, caso em que os atos e as omissões de um não prejudicarão os outros, mas os poderão beneficiar.

Do referido preceptivo legal extraem-se regras: i) a conduta prejudicial de um litisconsorte não pode prejudicar o outro; ii) a conduta benévola apenas beneficiará os demais no caso de litisconsórcio unitário.

Como se disse, a conduta benévola apenas beneficiária os demais consortes no caso de litisconsorte unitário. Esta regra encontra exceções. Como bem salientou Fredie Didier, no âmbito do litisconsórcio simples é possível que a contestação de um litisconsorte benficie o litisconsorte revel, desde que haja fato comum e seja este o fato impugnado. [13]

 

REFERÊNCIAS:

[1] ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense,  2017, p.205

[2] DINAMARCO, Cândido Rangel. Litisconsórcio. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 39

[2] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 172 apud DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. 18ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 479.

[4] THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p.337.

[5]Ibidem, p.338

[6]DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. 18ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 458

[7] Ibidem.

[8]MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento, 12ª ed., São Paulo: RT, 2014, p. 166.

[9]THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 340

[10]CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 21ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2011, p. 163

[11]DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. 18ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 471.

[12] Ibidem, p. 475.

[13] Ibidem, p. 475.

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