Reconstituição de mama deve ser custeada por plano de saúde.

De acordo com decisão recente do Superior Tribunal de Justiça, os planos de saúde são obrigados ao custeio do tratamento integral do câncer de mama, aí incluído o procedimento de reconstituição de mama, quando necessário.

Por ocasião do julgamento do REsp nº 1772800/RS em setembro de 2020, a corte reiterou jurisprudência já pacificada no sentido de que os planos de saúde podem restringir as doenças a que darão cobertura, mas não os tratamentos de que o beneficiário pode dispor. Bem como, afirmou caber ao plano assegurar o tratamento integral, isto é, todos os procedimentos necessários ao retorno ao estado anterior ao acometimento da doença, restando configurado o dano moral diante de uma negativa indevida.

O acórdão foi assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. SAÚDE SUPLEMENTAR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ABLAÇÃO DA MAMA QUANDO DO TRATAMENTO CIRÚRGICO DE CÂNCER. NECESSIDADE DE MAMOPLASTIA REPARADORA. NEGATIVA DE AUTORIZAÇÃO. DANO MORAL.

A jurisprudência desta Corte tem como assente que a injusta recusa à cobertura do plano de saúde gera dano moral, pois agravada a situação de aflição psicológica e de angústia do usuário, que ademais se encontra com a saúde debilitada.

A negativa de cobertura supera os inconvenientes de eventual descumprimento contratual que seriam resolvidos com apoio nas cláusulas do contrato e no direito contratual, podendo adentrar na seara do vilipêndio à dignidade do contratante.

A prestadora do serviço de saúde deveria arcar com procedimento que restituiria a paciente o mais proximamente possível ao estado pregresso à cirurgia, reparando-lhe o mal psicológico que decorre da ablação da sua mama, já que o mal físico teria sido removido no procedimento realizado.

Situação fática traçada no aresto recorrido suficiente a endossar o reconhecimento de danos morais indenizáveis.

AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

(AgInt no REsp 1772800/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe 24/09/2020)

 

Segundo a corte superior, a obrigação dos prestadores de serviço de saúde é a restauração do estado anterior de saúde do paciente, de modo que todos os esforços devem ser empregados para que os efeitos colaterais físicos e psíquicos dos tratamentos sejam reduzidos ao mínimo, sendo este elemento central da atividade médica que não pode ser limitada pelas operadoras.

Neste sentido, a reconstrução da mama posterior à ablação ou qualquer outra espécie de procedimento invasivo integra o tratamento e não se confunde com o procedimento estético (este, sim, fora do campo de obrigação do plano de saúde).

Neste sentido, inclusive, escrevemos artigo sobre a obrigatoriedade de custeio da cirurgia reparatória pós-bariátrico.

Em verdade, não se fez mais do que dar cumprimento ao disposto na Lei dos Planos de Saúde, que prevê desde 2001 a obrigatoriedade de cobertura destes procedimentos, ainda que muitos planos resistam à cobertura ainda hoje:

Art. 10-A. Cabe às operadoras definidas nos incisos I e II do § 1o do art. 1o desta Lei, por meio de sua rede de unidades conveniadas, prestar serviço de cirurgia plástica reconstrutiva de mama, utilizando-se de todos os meios e técnicas necessárias, para o tratamento de mutilação decorrente de utilização de técnica de tratamento de câncer

O voto condutor do julgado citado ainda enfatizou a vulnerabilidade psíquica da mulher que pleiteia a reconstrução mamária após uma intervenção invasiva em decorrência de tratamento de câncer. Assim, o relator afirma que “a negativa de cobertura de tão indispensável serviço supera os inconvenientes de eventual descumprimento contratual que seriam resolvidos com apoio nas cláusulas do contrato e no direito contratual, adentrando na seara do vilipêndio à dignidade do contratante.”, justificando, assim, a condenação do plano no dever de indenizar a Autora em R$ 8.000,00 pelos danos morais sofridos.

A mencionada decisão está de acordo com a jurisprudência histórica do STJ que vem sendo seguida pelos tribunais em todo o país.

Destaca-se, neste sentido, a possibilidade de concessão, ainda no 1º grau, de tutela de urgência em caráter liminar que determine ao plano a imediata liberação da operação. Vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA. NEOPLASIA MAMÁRIA. NEGATIVA DE TRATAMENTO DE SAÚDE.  RECONSTRUÇÃO MAMÁRIA. COBERTURA DEVIDA. DANO MORAL IN RE IPSA.  QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO. APELO DA RÉ IMPROVIDO.  SENTENÇA MANTIDA.

Não cabe ao plano de saúde questionar o tratamento prescrito pelo médico, que conhece o histórico clínico do paciente e detém a qualificação técnica necessária para indicar o melhor tratamento.

Conforme estabelece a Lei 9656/98, em especial o artigo 10-A, é dever das operadoras de plano de saúde prestar o serviço de cirurgia plástica reconstrutiva de mama após tratamento de câncer, devendo se utilizar de todos os meios e técnicas necessárias para melhora da sobrevida da paciente

A recusa indevida da operadora de plano de saúde à cobertura financeira de tratamento médico dá origem ao dever de reparar o dano moral in re ipsa, consistente no agravamento do estado de aflição e angústia do paciente. Precedentes do STJ.

O valor da indenização por danos morais deve atender à equação de não importar o valor arbitrado em enriquecimento ilícito da parte Requerente e, ao mesmo tempo, desestimular, de forma contundente, qualquer atividade nociva similar à denunciada pela vítima, por parte da Requerida. Quantum indenizatório mantido.

Sentença mantida. Apelo da Ré improvido.

(TJ-BA, Apelação, Número do Processo:  0409627-28.2012.8.05.0001, Relator(a): TELMA LAURA SILVA BRITTO, Publicado em: 28/08/2019)

 

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO – PLANO DE SAÚDE – RECUSA DE COBERTURA – CÂNCER DE MAMA – RETIRADA DA MAMA E RECONSTRUÇÃO MAMÁRIA – RECONSTRUÇÃO PERTENCE AO PROCEDIMENTO PRINCIPAL – CONTRATO ANTERIOR A LEI 9.656/98 – IRRELEVÂNCA – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – APLICABILIDADE COBERTURA DEVIDA – RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. […] As operadoras de planos de saúde não podem recusar a cobertura de despesas com itnervenção cirúrgica para reconstrução de mama, quando esta estiver relacionada ao tratamento de câncer, sendo abusiva a cláusula que exclui tal garantia. – É dever do plano de saúde cobrir as despesas decorrentes do tratamento de câncer, mesmo que o contrato não tenha sido adaptado à Lei nº 9656/98, por se tratar de procedimento indispensável ao pleno restabelecimento físico e psicológico da paciente.

(TJ-MG, AC 10000190057273001 MG, Relator: Mota e Silva. Julgado em 02/04/2019, publicado em 02/04/2019)

 

APELAÇÃO. DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA C/C PEDIDO ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. MAMOPLASTIA REPARADORA. PREVISÃO DE COBERTURA CONTRATUAL. NEGATIVA. DESCABIMENTO. COBERTURA DEVIDA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS, INCLUSIVE NESTA CORTE DE JUSTIÇA. APELAÇÃO IMPROVIDA, SENTENÇA MANTIDA.

Não cabe ao plano de saúde questionar o tratamento prescrito pelo médico, que conhece o histórico clínico do paciente e detém qualificação técnica necessária para indicar o melhor tratamento.

(TJ-BA, Apelação, Número do Processo: 0578464-07.2016.8.05.0001, Relator(a): JOÃO AUGUSTO ALVES DE OLIVEIRA PINTO, Publicado em: 20/05/2020)

Neste sentido, conclui-se que diante de uma negativa de cobertura da cirurgia de reconstrução mamária pelo plano, é possível, com a assistência de um advogado especialista, buscar o poder judiciário a fim de obter uma tutela de urgência para realização imediata do procedimento. Em sentido similar, posicionou-se Ana Clara Suzart.

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